Pesquisadores visualizam molécula do Sars-CoV-2 que “alavanca” infecção

Pesquisadores norte-americanos conseguiram visualizar detalhadamente a ação do glicano N343, molécula de açúcar que cobre as bordas da proteína spike do Sars-CoV-2, causador da Covid-19. A descoberta foi publicada no periódico científico Nature Chemistry nesta quinta-feira (19).

A investigação utilizou ferramentas de simulação avançada do Centro de Supercomputação de San Diego, nos Estados Unidos, para visualizar em nível atômico o processo de abertura do domínio de ligação ao receptor (RBD, na sigla em inglês) da proteína spike. Isso porque a infecção pelo novo coronavírus ocorre quando o RBD faz a transição de um estado “para baixo”, quando está coberto por um glicano, para um estado “para cima”, momento em que fica “nu” para se ligar com o receptor ACE2 presente na superfície das células humanas.

Embora tecnologias anteriores já tenham captado esse movimento, os pesquisadores afirmam que as observações ainda estavam restritas a posições estáticas abertas ou fechadas dessas estruturas. Com as novas simulações de supercomputação, foi possível desenvolver filmes dinâmicos que revelaram glicanos sendo ativados de uma posição para outra, a partir de mais de 300 perspectivas de abertura e fechamento.

A porta de glicano se abre: simulações orientadas por supercomputação mostram o glicano N343 (magenta) agindo como uma alavanca molecular para abrir o domínio de ligação do receptor do pico SARS-CoV-2, ou RBD (ciano), de um "para baixo" para um "para cima (Foto: Terra Sztain, Surl-Hee Ahn, Lorenzo Casalino (Amaro Lab, UC San Diego))
A ‘porta’ de glicano se abre: simulações orientadas por supercomputação mostram o glicano N343 (magenta) agindo como uma ‘alavanca molecular’ para abrir o domínio de ligação do receptor do pico SARS-CoV-2, ou RBD (ciano), de um ‘para baixo’ para um ‘para cima’ (Foto: Terra Sztain, Surl-Hee Ahn, Lorenzo Casalino (Amaro Lab, UC San Diego)

Os dados revelaram o papel crítico do glicano N343 no erguimento do RBD para a posição “para cima”, resultando na entrada do novo coronavírus nas células hospedeiras — por isso, o glicano foi descrito pelos pesquisadores como uma espécie de “alavanca molecular”. “As técnicas padrão teriam levado anos para simular esse processo de abertura, mas com as ferramentas de simulação avançadas de ‘conjunto ponderado’ do meu laboratório, fomos capazes de captar o processo em apenas 45 dias”, disse Lillian Chong, da Universidade de Pittsburgh, nos EUA, e coautora do estudo, em comunicado.

Em uma segunda etapa da pesquisa, os cientistas realizaram experimentos a partir de uma técnica conhecida como interferometria de biolayer (BLI, sigla em inglês), no Centro Avançado de Combutação do Texas (TACC), nos EUA. O método permitiu criar variantes da proteína spike sem o glicano localizado na posição N343 e outros que também tiveram algum papel na abertura do RBD, como os que estão nas posições D405, R408 e D427.

A equipe observou que, após as mutações nesses glicanos-chave, sobretudo o N343, a capacidade da proteína de interagir com o receptor ACE2 foi significativamente reduzida, diminuindo a capacidade de infecção do Sars-CoV-2. “Mostramos que, sem esse ‘portão’, o RBD da proteína spike não pode assumir a conformação de que precisa para infectar as células”, explica Jason McLellan, professor associação de biociências moleculares da Universidade do Texas em Austin, nos EUA, e um dos autores do estudo.

Embora nenhuma das mutações tenha abolido totalmente a ligação da proteína com o receptor ACE2, o estudo considera que a caracterização em nível atômico do mecanismo de ativação da spike faz dele uma referência para pesquisas da categoria. “As simulações oferecem uma base para a compreensão dos mecanismos fundamentais de entrada e infecção viral do Sars-CoV-2”, avalia o documento.

Além disso, os cientistas acreditam que a descoberta pode abrir caminhos para o desenvolvimento de fármacos capazes de bloquear a ação do glicano N343, de forma a impedir a abertura do vírus e sua entrada nas células humanas.

Fonte Galileu

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